sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

anúncio II


O túnel pregador de peças.
as peças do quebra-cabeça
e do relógio

das maquinagens do jogo do tempo
construídas, encaixadas

prego que prega a peça nos neurônios
dos teatros e suas máscaras

peças que play and replay
no automático, sistemático and cartesiano.

clock and choques.

Era madrugada e ela caminhava sozinha novamente. E no meio do caminho, o túnel. Era sozinha, e eram os perigos da madrugada e os barulhos que se ouviam nos ouvidos pensantes. Ela hesitou. Será? Olhou para os lados. Sentiu medo. Rios para dentro. "E agora?"... Ela acolheu nos braços aqueles arrepios. Abraçou a pele. Abarcou o escuro e feito passos em linha caminhou desengonçada em direção ao fim do túnel. pé após pé e veloz. Os perigos tão próximos talvez pudessem cortar seus pedaços e ela talvez morresse. Não queria que fosse a hora. Imaginação dos que saem, frangotes e de fininho. E ela, Maria, franguinha.

23 em 28. minutus num aquarium.









de nada.

por nada.


nada

nada

nada

nada

nada

nada

nada

nada,


...


nada peixe no oceano

despe-se das tuas escamas.

afunda nas obscuridades

do túnel que queima

respira o sufocamento

do ar rarefeito dentro do mar.


estufa o efeito nas conchas e na areia.


molha-se de sonhos

peixe no aquário do oceano

morre de arder e

...


nada.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

anúncio


A madrugada era fria, e no meio do caminho, um túnel.

- Você não tem medo de atravessar esse túnel? Nossa eu morro de medo... (disse enquanto apressava os passos).

Passou pela cabeça dela fazer um tipo das meninas que sentem medo, e aproveitar a desculpa para abraçar o braço do cavalheiro. Belo cavalheiro, por sinal.

- Não, eu não sinto. (disse a verdade, e diminuiu o ritmo dos passos como quem o convidasse para uma outra sensação diante dos caminhos desconhecidos. Pensou em dar a mão e apertar forte).

Não deu tempo. O corajoso rapaz largou uma primeira apressado até o fim do túnel. Ela, lentamente, aproveitava a escuridão e observava a desastrosa fuga.

- E do que você tem medo?

- Tenho medo de confiar nas pessoas erradas.

- Ah, então não confia tanto... (disse, bem intencionado).

" Pode deixar". Pensava Maria enquanto continuava lentamente os seus passos.

no money, no honey.




- Você me chamou???

- Não querida, everybory is "honey".

escrita muda

Agente não consegue falar. As palavras não saem da garganta. A garganta estranha. Lutar ou fugir. O que dizer? Como dizer? Agente não consegue falar. Deu dor de barriga. Ele ficou doente. Ela saiu como se nada tivesse acontecido. A outra cortou os cabelos. Ele mudou de país e disse que iria aprender inglês. Agente não consegue falar. Ela saiu sorrateira. Disse que nada havia acontecido. Agente não consegue falar. Sim. Não parece, mas agente sente. sente. sente. sente. Tudo igual. Ela só chorou um ano depois. Ela só percebeu um ano depois. As palavras não saem, simplismente não saem. Agente não consegue falar.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

a pescaria e o mergulho do pescoço


- Eu não quero aquário, quero mar. Tá me achando com cara de beta? O umbigo não é o Atlântico, e os olhos vão além do meu nariz. Não quero pés, quero o Nilo. Sereia não maluco!!! Tubarão.



Ela olhava as nuvens no céu do seu olhar. do sol, do seu, do céu olhar. Gira céu. Gira sol. Giro seu. Choveu. Gira mundo. Girafa com a cabeça além das nuvens. Gigante. Cores de Girassol. Gira, gira, gira... Estar de oito garimpando o infinito. Girandando.




- Fast, but sparkling.

o menino que caminha ao fundo da foto, camisa listrada e chapéu: por que não cabisalto?



para o palhaço, cambalhota, trapalhada. Cara a tapa. O nariz vermelho não é frio não!!! É calor!

É palhaço porque é graça e é de graça. Estúpido palhaço porque é pobre e um pobre.

São os quatro motivos.

Dizem que a máscara do palhaço, o famigerado nariz vermelho, é a menor máscara existente no mundo teatral. E qual mundo que não é teatro?

E segue, graciosa, feliz. Estupidamente gelada, quero dizer, quente. - É morena, garçon!

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

a verdade do drumond


Para amar, Neruda. Neruda porque ele é cem vezes e mais uma canção desesperado. Para alma, Bandeira. Bandeira porque ele é simples e exato. É dançar um tango, calmo, leve e imortal. Para pensar, Caieiro. Claro, ele é a pessoa das pessoas do Pessoa. Ele vê, e é isso. E a minha cabeça ainda tá mais é pegando no tranco. Gosta é de olhar mesmo. Já vale a pena para as almas não pequenas.

Mas as vezes é bom um gole seco do Drumond. Dessas doses que descem garganta a dentro, queimando. Mais um shot! E talvez ainda precise de mais uns goles de Machado, para beber das realidades sólidas que convivem junto aos mundos dos que acreditam e tomam leite parmalat.


*VERDADE*


A porta da verdade estava aberta,

mas só deixava passar

meia pessoa de cada vez.


Assim não era possível atingir toda a verdade,

porque a meia pessoa que entrava

só trazia o perfil de meia verdade.

E sua segunda metade

voltava igualmente com meio perfil.

E os meios perfis não coincidiam.


Arrebentaram a porta.

Derrubaram a porta.

Chegaram ao lugar luminoso

onde a verdade esplendia seus fogos.

Era dividida em metades

diferentes uma da outra.


Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.

Nenhuma das duas era totalmente bela.

E carecia optar.

Cada um optou conforme

seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

o inglês, o português e o italiano

Ela era brasileira. Ele italiano. Eles trabalhavam juntos em um café na cidade de Londres. Ela desconfiava de umas situações um tanto quanto desencaixadas que ocorriam continuamente naquele café. Conversavam em inglês:

- Elvio, fala a verdade pra mim, às vezes, quando falo com você, você não entende exatamente o que quero dizer né? (disse, meio que segurando o riso).

Elvio, franzino e pequeno, meia idade, olhou para Maria e não segurou riso nenhum. Soltou foi ele todinho. Depois seguiu sorrindo, olhos pra baixo, concentrado nas cenouras que estava cortando. Ele não iria responder??? Alguns minutos se passaram, e ele tomou a palavra, e em alto e bom som, disse, ainda olhando para as cenouras:

- Não se preocupe minha querida, às vezes, quando falo comigo mesmo em italiano, também não entendo nada.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

na aviação a coisa tá devagar mas no metrô ficou mais ligeira.



Ela descia as escadas do metrô atrasada. "- Soninha, preciso desligar que o trem tá chegando... Preciso desligar agora, tchal!!!! beijo Sonia... Tchal, depois te ligo". E enquanto terminava os últimos degraus, virava a mochila para a frente do corpo, abria o zíper, ia pegando a carteira, guardando o celular (tudo ao mesmo tempo, porque era mulher). "-Será que tem crédito no cartão?". Olhou para frente rapidamente. Naquele segundo em que notou o trem chegando, pensou no seu primeiro dia de trabalho no emprego novo, pensou que demoraria muito para o próximo trem chegar, também reparou na catraca, na máquina para comprar o bilhete, nas pessoas que passavam, em um rapaz a observava com um bilhete na mão. Ops. Retorno do olhar. Notou um rapaz que a observava com um bilhete na mão com uma fisionomia de sobrancelhas arregaladas, olhando fixamente para ela. - Sim, ele está olhando para mim e ele tem um bilhete na mão. Peraí, agora ele gesticulou levantando o bilhete na mão, como quem diz: "você precisa de ajuda?". Será que ele está querendo pagar a passagem para me ajudar?

Naquele curto segundo, ela tinha o trem que não poderia perder, tinha um bilhete em algum lugar da sua bolsa e alguém se oferecendo para pagar a sua passagem. Hesitou. Foi. Por que não?

Assim que atravessou a catraca, as portas do trem abertas, entrou. Mas disse sorrindo no caminho, "obrigado". Ele ficou sério. "Como assim obrigado?". Volte aqui e me pague por essa passagem. Ela olhou para ele, já sentada, e não entendeu o que estava acontecendo. "Você não se ofereceu para pagar as passagens pra mim? Quando eu estava entrando, você disse que..." . A porta do trem se fechou.

Ainda dava para ouvir os berros dele, que ao lado de fora da catraca, gritava alterado enquanto apontava para a máquina de comprar bilhetes. Ela ainda não tinha entendido. Olhava para ele através do vidro do vagão, como quem pede sinceras desculpas. - O que que aconteceu aqui?
O trem saltou. Mais segundos saltaram e ela entrou na viagem. - O que que aconteceu ali?. Rememorou os fatos com calma. "-Ah". "- Ele não queria me ajudar, ele deveria estar vendendo os bilhetes porque a máquina não estava funcionando, (que era muito comum nos metros da cidade), e esperava que depois que eu passasse, fosse pagar a passagem para ele. Ih! Eu dei um calote nele...". E sentiu-se culpada.

Próxima estação. Na verdade aquela situação a fez lembrar de outras. Como o dia em que seu computador quebrou, e ela perguntou no mercado que frequentava regularmente se alguém conhecia algum técnico de computação para ajudá-la. Ela agradeceu quando um dos rapazes do mercado se habilitou, mas assustou-se quando ele chegou em sua casa com uma sacola de queijos e outra com vinho, e ainda mais quando descobriu que ele não entendia nada de computador.

Lembrou da vez em que precisava alugar um apartamento e combinou de encontrar um amigo no final do dia para que visitassem um baratinho que ele disse que conhecia, e, quando o rapaz chegou, não existia apartamento nenhum, apenas um convite ensaiado "- Mas já que estamos aqui, você quer fazer alguma coisa?". E a outra vez em que seu outro "amigo" de dois meses lhe disse: "Eu conheço um jornalista bacana, e eu falei de você para ele, nós vamos arrumar um emprego pra você no jornal". Ela não acreditou, mas desafiou: "- Me passa o telefone dele agora". E dessa vez não se assustou quando ouviu: "Olha moça, aqui não tem ninguém com esse nome". E menos ainda, quando o mesmo cara de pau ainda ligou no dia seguinte: "Oi! Tudo bem??? Quer fazer alguma coisa?""

Terceira estação. Para variar, ela deu sorte. Nas vezes em que ela acreditou em primeiras intenções não haviam sido realizadas as segundas. Era terça-feira. Nem um arranhão. Como um trem que fecha a porta antes do desconhecido correr nervoso atrás da caloteira que não deu o que ele queria. Era o seu colega de quarto que chegava na hora em que ela havia ficado sozinha com o técnico do computador, era o telefone errado que por acaso tinha um amigo jornalista que precisava de uma assistente. "Nada é de graça nessa vida minha querida, um dia você ainda vai aprender isso". O ditado da tia veio na cabeça. A fisionomia alterada do cobrador do metrô. Cenas. Metrô. Mudou alguma coisa lá dentro.

O movimento do metrô agora é circular. Não. É um oito. As estações são o tempo, são os cabelos, são as lágrimas que saiam do rosto da menina enquanto ela olhava para as unhas sujas das mãos. Pequenas, ralas, fracas. A mão estava marcada. Não era mais polida. Agora ela tinha as mãos e os pés grandes. Os olhos cegos, entenderam e esqueceram no ritmo do segundo. Ela fechou os olhos naquele segundo enquanto apertava os dedos da mão. Estava cansada mas queria continuar.


Foi e acabou o trabalho. Depois, ainda ficou uma hora no trem até voltar para casa. Andou dezoito quarteirões sozinha. Chegou em casa, dormiu. Acordou as sete horas da manhã, arrumou a cama, preparou seu café. Abriu o jornal, leu. Saiu sem atraso e foi trabalhar de novo. E assim os dias eram todos iguais e diferentes para a menina que queria pensar mais um pouquinho. As vezes é bom tomar o trem para despertar.

da família das castanhas de caju


Era uma vez um garoto como ele. O menino dos olhos castanhos. Amava os Beatles e os Roling Stones, girava o mundo sempre a cantar as coisas lindas da América... Ra ta ta tá! Os olhos são grandes e castanhos. Expressivos olhos das noites em claro a bater perna por entre as retinas. Luzes que ascendem e apagam inconstantes por entre as voltas eternas das batatas da perna. Aquele par alumia ofuscante. Menino dos olhos dilatados.


Íris de Macunaíma mas sem a preguiça. "Não quero rede, quero moto!". Olhar brincalhão e imaginativo do menino. Otimista incorrigível, humor piada-pronta, conta estórias de terror para as criancinhas nanarem. Em seu cavalo de duas velozes rodas, não teme, enfrenta. Alan além d-Alma.

"- É o dono daquele belo par de olhos castanhos!" diria mais uma das moças tão acostumadas a admirar.

Um daqueles pequenos meninos , pés descalços a jogar sua bola e brincar de pipa. Menino desses que tacavam fogo na saia das freiras do colégio e se riam, e ainda riem desaforados de certas pomposas normas sociais.

Moleque atrevido dos cortiços da Aclimação, da terra Liberdade. Calorosos ventos brindam o olhar castanho dos pés já calçados do Doutor menino. Mas um dia seu doutô... Ra ta ta tá!


O menino teve que stop sem Mick Jager e nem o John. Não era o Vietna, mas também era bomba. Em nove meses, o menino iria ser pai. Nascia a menina! E ele, traquinagem, castanhando o destino: "Tudo vai dar certo".

E como sendo menino, ser pai da menina? E como saber ser realidade? 1984. Aposenta a jaqueta de couro ralada, guarda o disco do Raul, e coloca a motocicleta na garagem. O céu caiu na cabeça do menino. O céu azul.

Fortaleza menino em suas afirmadas masculinidades, fraqueza menino de noite, com a luz apagada. E como dizer para menina: "Ei, o menino também erra!..."?

Ela ouve. Ela sorri: "- Tudo vai dar certo." Dizia o pequeno par faceiro de olhos que se abriam. Olhos esses arregalados para todos os caminhos do planeta. "- Eu quero todos!"


Ele olha intensamente para sua menina. Tudo tinha valido a pena. E o tempo parou. Os dois pares de olhos castanhos, feito espelho refletiam-se marejados, brilhantes... e fez o Silêncio.

"- Ei! Isso aqui não é lágrima não, é meleca!".

"- Eu te amo só um pouquinho."

E riam-se arregalados. Grandes olhos de vários dentes, dentes de castanha.

terça-feira, 27 de novembro de 2007



As palavras escorrem pelos cantos das bocas e também são sons. Algumas são música para os ouvidos. Outras, taquara rachada.
Ela ouvia as palavras e brincava sinestésia dando cores e achamentos para elas. Podia colocá-las em blocos de significados e estabelecer a comunicação.
As máscaras beijavam-se e amavam-se no jardim.
Mas a máscara do dia não acreditou na máscara do dia que dizia palavras para ela. Ela queria formular um plano para arrancar a máscara da cara do cara. Não conseguiu.

Escolheu outra máscara no controle remoto, apertou o botão, continuou o dia.

"- Seria bom um cérebro nesse coração", disse enquanto pensava alto.


Os críticos que criticam e analisam ganhando dinheiro para tal formulam suas teorias retinóicas sobre o "por que" do sucesso da Frida Kahlo nos tempos modernos. Alguns deles, dentro das possibilidades de arquivo das suas ligações neurais, ilimitam em longas páginas o viés que o seu córtex visual inconscientemente ou não, resolveu escolher. Enfim, o mais importante é diminuir o crítico a sua altura. Sim, se você tem 1. 67, coloque o crítico sobre a mesma metragem material e metafórica. Isso vale para vocês de 1.92 também. Separei alguns córtex visuais que não serão nomeados.

- "A artista mexicana Frida Kahlo, o grande ícone da pintura ibero-americana, cuja arte "mexicanista" rompeu todas as barreiras e hoje em dia, no centenário do seu natalício, situa-se como uma das artistas ibero-americanas melhor valorizadas no nível mundial." (pelo menos não começou assim: "Nos tempos da globalização...");

- "Os corações em sofrimento estão unidos por veias braquiocefálicas direitas de ambos os corações. Tais veias estão tão unidas quanto unidas estão as mãos das Fridas. A Frida européia mostra seu coração dilacerado, aberto, com as valvas, músculos papilares e cordas tendíneas à mostra. A sua veia subclávio direita está presa por uma pinça sob controle da mão direita, dando a entender que a qualquer momento a Frida abandonada se deixará esvair em sangue até à morte." (essa é uma visão técnica e interessantíssima de uma médica sobre o famoso quadro intitulado "As duas Fridas")

- "Nada mais contraditório do que seu desejo de ser independente misturados à sua doentia obsessão por Diego Rivera. Nada mais chocantes para a época que suas bebedeiras, xingamentos e namoros com várias amigas." (essa tem um suporte mais tititi)

-"É difícil falar do pintor mexicano Diego Rivera sem o associar à agora tão mediática Frida Kahlo, que foi uma das suas mulheres. " (???)

Ela foi considerada "surrealista" pelo próprio André Breton, "realista" pelo Diogo de Rivera, "mexicanista"... Todos eles gozando fascinados pela pintora e pela obra da mesma. Bom, mas esses são os críticos, seus guias, seus dicionários, suas palavras...

O que eu amo na Frida é a dor, certamente. Ela possui inúmeros quadros com o coração literalmente pintado na mão, como se o estivesse esfregando na nossa cara o tempo todo. É como se ele estivesse batendo em cada uma das suas telas, nas roupas, na sobrancelha, no devotamento pelo Diego, na sua arte. Uma vez a Frida Kahlo, respondeu assim, para um desses críticos que a consideravam "surrealista": "Eu nunca pinto sonhos". E eu penso em uma dessas imagens do rosto da Frida, com um coração na mão, veias saltando pra fora, com a vida difícil, cercada de doenças e frustrações que ela passou, e eu não vejo esse "sonhar"... Essa entrega animalesca aos instintos do coração á apaixonante. Mas dói.

É louco porque é uma vazão ao sentimento, é uma atitude vivida diante da pálida realidade, que no dia a dia, em cotidianos tão superficiais, fica surreal. Mas não é. É uma realidade em outra. E essas realidades são entregas diferentes, e também, cada uma com o seu córtax visual fazendo sentido.

A Frida caminha com o coração sangrando na mão. Segue resiguinada e o sangue continua escorrendo no chão... E esse coração se repete materialmente nos seus quadros. Na sua mão. O seu coração é o seu escudo, e o seu ataque diante da vida, ao mesmo tempo. O seu coração é a sua arte. É como se a possibilidade de naquela mão existir um cérebro fosse longínqua...


Daí eu fico com a Frida, e longe das réguas dos críticos. Meu amigo é que me fala sempre:
- Constância, dá só a metade!!!

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Oração ao Tempo

"Por seres tão inventivo

E pareceres contínuo

Tempo tempo tempo tempo

És um dos deuses mais lindos

Tempo tempo tempo tempo..."

Caetano Velozo



Este é o meu verso favorito na canção do Caetano. Como pode ser inventivo e ser continuo ao mesmo tempo? Eu me peguei perguntando isso diversas vezes, nos meus momentos de café, ou de pinga... É que esta palavra que ele escolheu para exemplificar as tempestades, os altos e baixos que o tempo traz as nossas indigestões é de uma paz tremenda: "inventivo"... Inventivo... inventivo nada! Posso dizer até que essa definição é de uma boa vontade intencionada, já que o eu-lírico da canção tá querendo no fundo é fazer um pedido ao tempo. O tempo é puta que o pariu!!! Como assim deixar você completamente maluco, durante anos e anos, e de repente, num diazinho só, fazer sentido.

Eu, na minha relez interpretação do Tempo, xingando o Tempo, tendo uma visão tão "presente" do Tempo, e sem entender o "presente" que na verdade é o Tempo, via-o como quem olha a um Deus Sádico, ou talves um Deus Brincalhão, ou ainda, o Tempo como um Deus que costuma acordar mal humorado... Mas acontece que o Deus Tempo atravessa passado, presente e futuro. E continua... infinito.

O vilão dos anciosos e a força dos pacientes.
- Ei!!! Também escuta o meu pedido? Também quero que tudo faça sentido no final.


sexta-feira, 2 de novembro de 2007

traçados geo-gráficos e astro-lógicos.


















- Já te disseram que você é muito ingênua???
- Já. (risos).
- Qual é o seu signo???
- Capricórnio.
- Pô! Você deveria ser mais realista.
- É que eu sou capricórnio com ascendente em sagitário e a lua em peixes.
- Deve ser a lua em peixes... Eu sou gêmeos com ascendente em áries e lua em Leão. Então você já viu, né!!! Eu sou... Argth!!!!! (disse gritando).
- E eu sou touro... com ascendente em virgem, e paro por aí. (Disse a outra, tentando participar). As três riram.

***

- Olha eu preciso te avisar uma coisa... Eu sou um homem muito sentimental, muito sensível. Então se você está combinando de sair comigo, por favor saia, atenda o seu telefone, por que eu sou muito romântico, eu vou ficar pensando em você. Por favor... Sério mesmo. (disse olhando fundo nos olhos da mulher). Você vai achar estranho, mas é que eu sou cancerino e por isso...
- Cancêr???
- Por que? Você conhece alguém de cancêr? Porque se conhece alguém deve saber do que estou falando...

Maria pensou uma coisa. Maria disse outra coisa. E para finalizar Maria ficou olhando para as coisas sem pensar naquelas coisas em que estava olhando. Maria pensava em coisas distantes. A astrologia reservava significados significantes ao universo astral e a geografia mundial. Pensou em mapas e em símbolos. Em telas e em legendas. Signos Cotidianos. Maria visualizava nos Trópicos linhas paralelas que não se cruzariam nas perspectivas opositivas astrologicas, e nem nas perpendicularidades cartográficas. Não, não se cruz-avam, mas corr-iam separada-mente-juntas. Filhos do Equa-dor Mito-lógico. Mistura-riam-se em sonho se cá ao norte e lá nu sul houvessem bússulas dos camiños além do Equador. Mas não hay.

Seguiram... os traços. Opostos e paralelos. Ao vento, e ao infinito. Dois mundos, dois valores pós-mistur-ação. Espelho para os pobres cegos perdidos em suas mitologias tão humanas. Esse jeito tão limitado de olhar o mundo e tentar explicar o inexplicável. o muito Maior. The end.

O mundo fantástico de Alice é fantástico por que é quase de verdade.


"Olhei até ficar cansado
De ver os meus olhos no espelho
Chorei por ter despedaçado
As flores que estão no canteiro
Os punhos e os pulsos cortados
E o resto do meu corpo inteiro
Há flores cobrindo o telhado
E em baixo do meu travesseiro
Há flores por todos os lados
Há flores em tudo que eu vejo

A dor vai curar essas lástimas
O soro tem gosto de lágrimas
As flores têm cheiro de morte
A dor vai fechar esses cortes
Flores
Flores
As flores de plástico não morrem..."

Eu ingê-nua? E você, quem é você eu-gênio? Acreditar que as pessoas podem ser boas é uma opção. Esperar que aconteça o melhor é uma opção tão importante quanto decidir o meu futuro profissional. Até mais importante. Eu gosto de ser assim. Acho que as minhas probabilidades de se dar mal são tão grandes quanto as suas. Quem é que está iludido aqui? Você acha que pode escapar de alguma coisa? Eu me jogo na sujeira e danço sobre ela. Feito criança que pula naquelas poças de água suja da chuva, que ficam no caminho da gente, quando a chuva já se acabou. A água suja da chuva não me incomoda. Eu agradeço a Deus por cada vez que eu caí. Eu me levantei em todas.... eu descobri o rebolado tufão dos quadris dançando nas poças de água da chuva. E eu danço sempre. E me levanto limpa. Acreditar nas pessoas vem do meu coração, e não é pra fazer sentido. Assim o é... "Inocência Ideológica".

OBS. A música *Flores* foi composta por Tony Bellotto, Sérgio Britto, Charles Gavin e Paulo Miklos. Vulgo Titãs...

sábado, 27 de outubro de 2007

elegia ao elogio feminino

ELe - Gostei de muito conversar com você.

ELa- Sério... Por que? (disse isso com falso
espanto de final de noite)

ELe- Estranho, mas você me faz pensar...

ELa- Obrigado.


O espanto tornou-se verdadeiro, e ele não era óbvio. Feliz final para noite. Sem sonhos, mais repleta de conflitos intelectuais. Alice olhou satisfeita para a Lua. É Lógico. E ele, eleito.

falando de violão, lembremos que *o instrumento pode ser música*


- Nossa! A mulheres no Brasil deve ser muitos inteligente!!! Eu gosto desse pessoa... (atrapalhou-se) das mulheres do Brasil, é muito legal. Não sei disso.

A professora largou a gramática. Ela olhou para a cara do seu aluno... Definitivamente, não havia entendido. Olhou mais. Essa era a grande mania da professora Alice, olhar. Será que era o português? Pediu então que ele tentasse explicar em inglês, já que era a língua que ambos poderiam se entender. Se se entender fosse possível.

- Não, por que sabe aquela revista que você me trouxe para ler sobre o Brasil, então, tinha várias reportagens sobre mulheres que saem juntas para tomar café, que se organizam para ver palestras sobre o feminismo. Lembra daquela canção da Rita Lee sobre a vida das domésticas, em que você me disse que nas favelas a figura da mulher era muito importante, já que elas que sustentavam as famílias...

Ele não precisava falar mais nada. Ela sorriu, diga-se de passagem muito satisfeita. E o aluno francês, que estudava "português para estrangeiros" com a tal professora, prosseguia encantado, espantem-se, com a inteligência e política da mulher brasileira...

- E hoje você me trouxe essa história em quadrinhos, sobre as mulheres que discutem sobre o "ser mulher" com um olhar contestador. Eu estou gostando muito das coisas que estou aprendendo sobre a mulher no Brasil.

Ela olhou foi bem muito para o aluno, dessa vez como mulher. Ele não estava descrevendo as mulheres do Brasil, ele estava descrevendo uma entre elas. Alice olhou para dentro, e se sentiu aluna. Sorriu. E como uma mulher inteligente, fez o que mais gostava. Pensou. Optou por deixá-lo curioso. Gostava de deixar as pessoas curiosas, alimentava tantas quantas interrogações fossem possíveis. Não gostava das manias de verdades absolutas. Continuou séria:

- Que bom que você tem gostado das nossas aulas. E agora, voltemos a gramática!!! Ainda temos cinco minutos, não me enrola não senhor Benoit!

***


Os quadrinhos "Mulheres Alteradas" é editado no Brasil pela Rocco, e a escritora não é compatriota. Ela é argentina. Mas como não é futebol, eu faço o marketing gratuito! Maitena, 40 anos, três filhos, três maridos diferentes, é magra, loira e bonita... (para acabar com os rótulos), e vendeu mais de 300 mil livrinhos em seu país. Caixa acústica de geométricas formas e interiores músicais*. Violão Maitena. O que torna as suas histórias tão populares (que inicio de frase mais pretensioso! mas como é propaganda assumida...) são o humor refinado e as verdades ditas "na lata" sobre a realidade que altera nossos nervos todos os dias. Não é a tpm, não é a lua... é maitena! Antenada nos surtos! Se você é mulher, vai se sentir naquela conversa no bar com a melhor amiga. E mais, vai treinar o dedilhado... Dá corda para as cordas menina!

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

BRAZIL JUNINO: crítica e auto-crítica ao Brazilian Day.

garotos da capoeira

brazil em bandeiras

garotas de ipanema





"os róseos laços de aço desatados, não tratam denforcamento, masmalemolência".













Foi num dia que a moça tava diferente. Angiospérmica. Ela acordou de sua cama e olhou acostumada aquele velho lençol florido. O desenho das flores do campo, o colorido feliz das flores do campo, e o perfume que ela não sentia naquele velho lençol. A moça, ali, em pálida ressaca tentava sair desastrada daquela cama. Passeou novamente os olhos pelo lençol. Olhou sua velha pele, olhou o tecido. Ele parecia com um vestido da sua finada tia Margarida! Rios para dentro. Pensou sobre os processos de polinização. Desejou um inseto. Pensou na função de fertilização e notou o botão de rosas que decorava o criado mudo. Engraçado, as flores do lençol e o botão, eram todos enfeites. Cabeça novamente no travesseiro, a fronha. Olhou em anthesis. Reparou nos laços cor de rosa da fronha. Sentiu um calafrio. Achou que pareciam de aço.

Levantou-se, enfim, e em continuo pensar se dirigiu a penteadeira de todos os dias. O espelho e o reflexo de também todos os dias. Ou não. O reflexo da moça no dia em que ela estava diferente era como se gramínea. Olhou a delicada escova e iniciou mais um madalena pentear sobre os longos cabelos. Mas por que tão longos? Por acaso rapunzel? Passou o pó de arroz, passou o batom vermelho. Ele parecia sangue. Imaginou o sangue que andava sem parar por dentro do corpo. Gostou. Rios para dentro. A imagem pálida refletida no espelho, os longos cabelos. Século vinte e dois, e ela gioconda! O sangue escorregadio sobre o mato livre do campo foi a última imagem que viu no espelho.

Chegou na janela, apoiou-se. Rios para fora. Olhava faminta. Precisava dos lactobacilos vivos, do néctar das proteínas e de dançar vadia na chuva. Os sons da chuva caindo na terra ao lado de fora da casa. Olhou de novo. Tentou imaginar o cheiro que teria a terra molhada pela chuva. Franzio a sobrancelha. Olhou as paredes do quarto. Reparou as cortinas que não balançavam ao sabor do vento. Como seria o gosto do vento batendo na pele da gente? Ela reparou no vidro. A moça, de repente tinha muito mais pra olhar naquele dois acostumados olhos. E eles cresciam junto com o franzir das sobrancelha. O momento esbugalhado do olhar.

Eram muitas cabeças a passear pelos todos cinco cantos do quarto. Eram olhos acima e abaixo. Sete cantos do quarto. Aquela penteadeira de todos os dias, os laços de aço da fronha e o vermelho do batom. Sangue. A penteadeira de todos os dias e os laç... os nada. Agora era mesmo a tesoura que ela acabara de reparar no canto esquerdo da penteadeira. Parou de pensar. Decidiu brincar com a tesoura. Olhou os cabelos. Tesoura e o cabelo. Não teve dúvidas. Rios para dentro e para fora. Naquele dia em que Madalena acordou diferente, ela sentiu uma estranha calma. Estava entediada. Começou a caminhar pelo quarto desordenadamente e cada vez mais veloz. Correu até a cama e sentou. Rio. Pegou a tesoura e também cortou aqueles laços de aço com uma brutalidade assanhada. Sentiu prazer. Era Madalena a là Sade.

No baú, intacto estava seu diário dourado. Sentiu um enjoo com todo aquele pó. O peso dos pesares naquele velho estúpido diário. Decidida e indelicada lançou-o no vidro da janela. Rio. O vidro da janela despedaçado caia no chão, enquanto ouviam-se passos até a porta da frente. Suspirou. Atravessou aquela terceira margem, aquele curto e infinito espaço entre a porta e o mundo carregando ainda algumas ilusões. Não, ela não era livre. E quem o é?

No dia em que a moça acordou diferente, ela estava livre. Mas atriz, aproveitou o show. Malemolenta Madalena aproveita bem a viagem.

sábado, 13 de outubro de 2007

"Vou demais" porque hesita
ou exita porque vai demais?
Maria, Maria...


êxito existencialista
se excelentíssima
eximia cismaria


sesmaria ao esmo
só cessaria
sem titubear

Maria Exita sem ága.


OBS. Maria Exita é personagem do conto "Substância", de Guimarães Rosa.

Maria "vai demais" na Cachoeira de Água Salgada do claro e caro Clóvis.




SIONÉSIO - "Você, Maria, quererá, a gente, nós dois, nunca precisar de se separar? Você, comigo, vem e vai?"

MARIA EXITA - "‘Vou demais."

Sionésio e Maria Exita - a meios-olhos, perante o refulgir, o todo branco. Acontecia o não-fato, o não-tempo, silêncio em sua imaginação. Só o um-e-outra, um em-si-juntos, o viver em ponto sem parar, coraçãomente: pensamento, pensamor. Alvor. Avançavam, parados, dentro da luz, como se fosse o dia de Todos os Pássaros."

Trechos extraídos do conto Substância, de Guimarães Rosa.
***

Linguagem do Amor. Porque Rosa, neste trecho, não apenas fala sobre o amor de Sionésio e Maria Exita, mas da própria expressão do amor em nossas humanidades. "Exita", "Vem e vai", inseguro, travado amor enquanto sentimento e pensamento brigam dentro . Até o aliviante "Vou demais", e o Amor, sendo "dois", sendo "ato consumado", aconteceu. Transforma-se então, em "amor-metáfora", e em seus destinos subjetivos. Entendeu?

Então sente.

Fica o convite, ao dia de Todos os Pássaros. Ou o mergulho, na Cachoeira de Água Salgada do meu claro e caro Clóvis. Eu já pulei. De alma despelada, penada, pelada e tudo mais.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Ainda bola fora, meu caro Clóvis.

Sim, ela estava bem a sua altura. Ombros para trás. Estatuária. E o nariz de batata que ficava empinado quando ela levantava a cabeça para cima. Armadura. Porque simplesmente ela não se despia e se jogava naquela estúpida água? Por que que as pessoas tem medo de ficarem assim, peladas por dentro? Sentimento. A visão daquela cachoeira de água salgada despertara alguma coisa lá dentro. E ela precisava urgentemente ficar pelada. ficar pelada. ficar pelada. ficar pelada. ficar pelada. Pensou em gritar para o senhor que passava na rua. "Ei, você, me ajuda a tirar a pele???" Como se mergulhava na cachoeira se existia a pele no caminho? Água de beber, camarada.

terça-feira, 9 de outubro de 2007


ser, quando era
se já era
o era do ser

ser, nova era
se era
sou eu.

Era ut supra







Carolina Lomba

Ode à bike



I.Era ut retro

Era uma quarta-feira, e eram sete horas da noite. Ela estava sentada a algumas horas diante do computador. Dia de folga. E o prazer de rever umas fotografias, escrever uns e-mails, fazer uma leitura, prazer de tempo livre. O telefone tocou.

- Oi tudo bem! Lembra de mim? Sou eu, o Vladi.

- Olá, tudo bem.

- Eu resolvi te ligar porque pensei que talvez poderia te convidar para sair, o que você acha? Você tem tempo livre no final de semana? Nós poderíamos sair para jantar em algum lugar, qual é o...

- O que vc tá fazendo agora?

- Ah, eu estou chegando em casa. Mas porque, você... Você está com fome? Gostaria de sair para comermos alguma coisa?

- Na verdade, eu não tô com fome não. Acabei de comer. Você gosta de natureza?

- Se eu gosto do que?

- De natureza, tô perguntando se você gosta de natureza?

- Ah, sim, eu gosto, mas porque...

- Não, porque eu tô com uma saudade de natureza, e eu conheço um lugar meio escondido maravilhoso, dá pra ver a lua, tem um jardim, de frente para o rio, lindo. Você tem uma bicicleta?

- Se, se eu tenho uma bicicleta... Não, por que? Você tem uma bicicleta??? Você anda de bicicleta na cidade?... Mas por que você está me perguntando isso? Você tem uma bicicleta pra me emprestar?

- Não tenho uma bicicleta pra te emprestar. É que da última vez que fui lá, cheguei de bicicleta...

- Mas dá para chegar sem ser de bicicleta?

- Olha, eu nunca fui a pé, mas agente acha. Não se preocupa. Vamos nos encontrar no metrô daqui uma hora?


***
II.Eius est nolle qui potest velle

Eram duas horas depois, e Alice caminha até o lugar combinado. Ele estava vestido de preto, braços cruzados, boné. E Alice, vermelho, cabelos soltos, sorriso largo no rosto. Ele, silêncio, sobrancelhas espremidas no centro da testa. Ela, entre risadas e muitos assuntos. Dizia, divertida:

- Nossa, uma das melhores coisas aqui é andar de bicicleta, eu faço tudo de bicicleta, vou para qualquer lugar, em qualquer horário. É que na verdade, eu gosto de adrenalina...

- Ah é?

- É, eu gosto de praticar esportes radicais. Já fiz rapel, bungee jump, trilhas... Ah! Teve uma vez que...

- E... você costuma fazer essas coisas sempre? - Perguntava encolhido no banco do metrô, olhos arregalados em direção a Alice.

- Claro, adoro uma emoção.

- Mas me fala, esse lugar que você está me levando, é seguro? Tem mais gente por lá? Onde que fica mesmo?

- Não se preocupa não! Você vai adorar. Quer um chiclete?


***
III.Era ut supra

Eram horas depois. Eram caminhadas depois. Eram as estrelas, era a lua e eram os aviões que passavam. Era a escuridão da noite, eram as árvores, eram as cores das flores. Eram as luzes da cidade refletidas no rio, e era o cheiro do rio. Era a melodia dos grilos e o forte som da água batendo na madeira. Era o vento fresco e manso que sentiam na pele, era o clima agradável. Eram as luzes azuis que decoravam o jardim, era a arquitetura grega em volta do campo. Era Eros ébrio e Hera sem argos ares. Era de aquário.

- Nunca tinha vindo para esse lugar. Que perfeito. É isso, essa é a palavra, perfeito... Sabe, quando você me convidou, pensei assim, "Como assim!!! ela está me perguntando se eu tenho uma bicicleta". Mas resolvi vir por que pensei que poderia ser alguma coisa interessante. Diferente, com certeza. Mas esse lugar é especial, como descobriu? Eu nunca tinha vindo aqui, e olha que eu moro aqui a mais tempo que você... Nem parece que estamos tão perto da cidade.

Alice olhou. Alice apenas disse:

- Foi com a minha bicicleta.


***
OBS. Tradução das expressões em latim:
Eius est nolle qui potest velle: Pode não querer, quem pode querer.
Era ut retro: Data como atrás.
Era ut supra: Data como acima, data supra.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Barulhenta Daniela




















Manhã ensolarada. Abrir uma empresa, arrumar um emprego, ganhar um almoço num restaurante grego, ir pra praia (quase...rs), necessário café. Lua Cheia. Violãocelo, violão, gaita, violino, hippies, músicos e boêmios... O que está acontecendo? Pipoca, o show de Daniela já vai começar. Palmas para morena. Palmas, porque Daniela gosta é dos seus sons.


*Sons da Cidade*, por Daniela Romeu

Pensando. Sons de pensamentos de onde devo ir ou onde estou indo. Ainda não sei. Não tenho certeza. Paro, mas ainda não posso escutar nada. Quero ser levada pelos meus instintos mas, onde? Quando minha mente me diz direita e meu coração me diz esquerda. Para onde ir? Quem devo seguir, a emoção ou a razão? Saio do trem quase que caindo no rio. Olho o mapa, e me parece ser em inglês, pois não entendo os diagramas. Talvez eu fui mais longe do que devia. Direita ou esquerda? Acho que direita é sempre direito e a esquerda é sempre errada. Estou andando.

Vamos falar sobre outras coisas, desse jeito ninguém pode nos entender. Achamos aonde ir, mas não sabemos onde ficar. Muito complicado. Talvez, deveríamos continuar andando. Espere um momento. Eu já estive aqui, eu reconheço o som e é familiar... Som de uma cafeteira. Talvez possamos parar e limpar nossos pensamentos com nossa diária dose de cafeína para nossas mentes. Voltando a falar uma língua estranha, mas espere, alguém pode nos ouvir, talvez não somos tão estranhas assim, e nem estamos sozinhas mais. Devemos ligar? Acho que é apenas um encontro casual em um dia de encontros inusitados. E o que mais nos espera?

Continuamos, e eu posso ouvir algo ali. Em baixo do Triunfo, eu ouço um sério e grave som que me leva para outro lugar, um lugar que nunca estive. Eu não pude ver, talvez era uma estrada para um amor nunca encontrado, ou um trem para minhas próprias ilusões ou um avião me levando de volta pra casa. Ainda não sei. E eu continuei no trem que seguia a estrada para lugar nenhum.

Hora de seguir em frente, já desligaram a luz e creio que por hoje a noite acabou. Mas não posso simplesmente ir assim, e nem quero. Seguindo meus pés, já que nem minha razão ou meu coração puderam decidir de onde o som estava vindo, eu encontrei uma "Graça Maravilhosa". Eu pude ouvir algo ali. A guitarra que era tocada com uma paixão furiosa, confundindo os dedos em um lindo som, eu quase pude ver aqueles dedos voando nos acordes. Isso não era apenas som, aquilo era alma, aquilo era música. Quase que instantaneamente encontrei uma família, cores diferentes, tamanhos diferentes, culturas diferentes, mas ainda assim uma família. Cantando com a lua cheia olhando para mim, me senti abençoada, confortável e surpresa. Eu não estava seguindo nada, apenas meus instintos do momento, e me senti bem. Ainda ouvia musica, ainda ouvia risada, ainda dançavamos. A guitarra continuava e agora um hippie tocava percurssão. Adorável diferenças e cores de se admirar. Hippies que brincavam com os olhos e mentes dos estranhos. Sem se importarem, e tão pouco nos importávamos, ainda éramos uma grande família naquele momento.

Pessoas vieram e pessoas se foram e continuamos até o som da proibição que declarava paz para os vizinhos e moradores de rua daquela praça, e esse som fez uma família se desunir. Rompeu uma família que disse que talvez poderiam ver uns aos outros mais uma vez, mas provavelmente nunca iriam, talvez não seria o mesmo sem a fumaça do hippie que fumava seu cigarro na bicicleta. E me parecia apenas uma noite. Andamos ainda com algumas risadas. Corra, pegue o trem, precisamos ir para casa. Escute isso. Você pode escutar o som da noite e o relógio se movendo para o próximo dia? Agora é hora de encontrar o som da paz.

sábado, 22 de setembro de 2007

Esquadros da Adriana

"Eu ando pelo mundo prestando atenção,
em cores que não sei o nome.
Cores de Almodovar, cores de Frida Kahlo, cores.
Passeio pelo escuro,
Eu presto muita atenção no que meu irmão ouve.
E com o uma segunda pele, um calo, uma casca,
Uma cápsula protetora,
Eu quero chegar antes.
Pra sinalizar o estar de cada coisa, filtrar seus graus.
Eu ando pelo mundo divertindo gente.
Chorando ao telefone e vendo doer
A fome dos meninos que têm fome.
Pela janela do quarto,
Pela janela do carro,
Pela tela,
Pela janela,
Quem é ela , quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado, remoto controle.
Eu ando pelo mundo, e os automóveis correm para quê?
As crianças correm para onde?
Trânsito entre dois lados,
De um lado eu gosto de opostos, expondo o meu modo, me mostro.
Eu canto para quem?
Eu ando pelo mundo e meus amigos, cadê?
Minha alegria, meu cansaço?
Meu amor cadê você?
Eu acordei, não tem ninguém ao lado.
Eu ando pelo mundo e meus amigos, cadê?
Minha alegria, meu cansaço?
Meu amor cadê você?
Eu acordei, não tem ninguém ao lado." A. Calcanhoto


As linhas perpendiculares são riscadas na folha branca de papel. O lápis desliza sobre a folha fazendo um som que soa mais como o motor de um trem em movimento. Colisão. Dois trêns, duas linhas, noventa graus, estações e degraus. Ângulo reto, e as linhas trilhadas, em silêncio. Plenitude da Esquadria. Culpa da Adriana.

Quem é ela? Quem é ele? Longíquo controle de enquadrar, ou controle remoto moderno de clicar. Amor Tecnológico. Amor ao quadrado. Esquadros.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

história de uma gata... Miauuu!



No Camarim, Alice estava nervosa. Adorava aquela artista. Queria pular, agarrar... Mas conteve-se. Olhou, postura no lugar, pernas cruzadas. Sim, Alice parecia elegante.

- Eu gostro de entrar nas minhas comunidades do orkut, pra ver o que as pessoas estão falando de mim, e... (dizia Vanessa) Teve uma vez, uma menina falando que o namorado havia mandado para ela a minha música nova, a *Boa Sorte*, e ela tava perguntando para as pessoas se eles concordavam que o tal namorado gostaria de terminar com ela ou não... Eu pensei, minha filha!!! (e gesticula uma cara de louca). É muita inocência!!! rsrs...

- (Vanessa da Mata continuou) Mas é muito louco essa coisa de como a música pode marcar um momento da sua vida.... Chega até a ser uma coisa meio sensorial, de você conseguir sentir o cheiro, de sentir aquela mesma energia de novo... Essa coisa da lembrança, da força que uma música pode trazer pra você. Todo mundo tem uma música que marca uma determinada fase. Teve uma fã minha, que me disse que estava pensando em fazer um aborto, e escutou aquela minha música do primeir cd, sobre a chegada do filho (cantarola um pouquinho). Ela veio me agradecer depois de um show, dizendo que aquela música foi para ela, que ela não abortou o filho por causa da música... E é muito louco por que a música não falava exatamente disso.

Nesse momento Alice teve vontade de interromper! Queria dizer que uma música interpretada pela própria Vanessa que também fez história na sua vida, que mudou o seu rumo, e que lhe deu força. Talvez fosse a música do começar conhecer-se Maria, de conhecer-se Vento. Não, Maria viu-se tímida diante de Vanessa, e diante de vocês também... Mas, a questão é que dessa vez, ela conta qual a música:

*Historia de uma Gata*
Chico Buarque

Me alimentaram
Me acariciaram
Me aliciaram
Me acostumaram

O meu mundo era o apartamento
Detefon, almofada e trato
Todo dia filé-mignon
Ou mesmo um bom filé... de gato
Me diziam todo momento
Fique em casa, não tome vento
Mas é duro ficar na sua
Quando à luz da lua
Tantos gatos pela rua
Toda a noite vão cantando assim

Nós, gatos, já nascemos pobres
Porém, já nascemos livres
Senhor, senhora, senhorio
Felino, não reconhecerás

De manhã eu voltei pra casa
Fui barrada na portaria
Sem filé e sem almofada
Por causa da cantoria
Mas agora o meu dia-a-dia
É no meio da gataria
Pela rua virando lata
Eu sou mais eu, mais gata
Numa louca serenata
Que de noite sai cantando assim

Nós, gatos, já nascemos pobres
Porém, já nascemos livres
Senhor, senhora, senhorio
Felino, não reconhecerás

*Good Look, Boa Sorte*



Ela chegou em casa cansada, e olhou no relógio. Iria ou não iria para aquele show... Faltava uma hora para o inicio do show, e ela estava na cama, deitada, olhando indecisa para o relogio. Pegou a carteira. Tinha cento e quarenta reais, e o show custava cento e vinte. Sim, poderia ficar um tempo sem dinheiro, estava tão em cima da hora, e ela estava tão cansada, afinal ela passou o dia todo carregando aquelas caixas... Pensou que poderia aproveitar aqueles minutos pra descansar, tanto tempo que não dormia... Foi para show! Sim, se arrumou em um minuto em foi para o show. Definitivamente toda aquela quantidade de fatores pesando contra sugeriu na garota uma desejo grávido de ir para o show. Levantou correndo, abriu a gaveta, procurou a roupa mais colorida, colocou tiara, brinco, anel, pulseira, meia colante, sapato vermelho, saia, e por que não uma blusinha preta de bolinhas? Pronto. Estava perfeita! Maquina digital, pilhas... Foi sem banho. Tudo em exatos dois minutos... Pronta, aprontava-se e aprontava. Já no metrô, houve tempo para respirar, respirou. Ahhhh!

Chegou no show, escolheu uma entre as possíveis cem pessoas presentes na frente do teatro, para perguntar onde seria a tal da bilheteria. A pessoa que escolheu para perguntar sobre a tal da bilheteria, por acaso tinha um ingresso a mais, de uma amigo que não havia aparecido, para a área VIP do show. Foi, sentou na terceira fileira, dançou saborosa, e ainda entrou no camarim do pseudo-artista. E pensava deliciada... eu amo a minha liberdade. Sabia que dificilmente essas coisas acontecem quando se está acompanhada de muita gente. Fazer o que, ela bem sabia da paz de se viver solto. Depois do show, e com a mesma companhia, conheceu o artista, a empresária, os músicos... E depois, algumas novas ruas, alguma nova praça... Estava cheia de vida... Estava feliz. Mas os pés, sorrateiros, sempre com as suas rodinhas. E disse elegante: não.

Viva o keep going à La Bete...

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

junto ao Vento...




"Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaúba.
Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros;
Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa, para que o barco aventureiro manso resvale à flor das águas.
Onde vai a afouta jangada, que deixa rápida a costa cearense, aberta ao fresco terral a grande vela?
Onde vai como branca alcíone buscando o rochedo pátrio nas solidões do oceano?
(...)
A lufada intermitente traz da praia um eco vibrante, que ressoa entre o marulho das vagas:
- Iracema !
Que deixara ele na terra do exílio?
(...)
Refresca o VENTO.
O rulo das vagas precipita. O barco salta sobre as ondas e desaparece no horizonte. Abre-se a imensidade dos mares, e a borrasca enverga, como o condor, as foscas asas sobre o abismo.
Deus te leve a salvo, brioso e altivo barco, por entre as vagas revoltas, e te poje nalguma enseada amiga. Soprem para ti as brandas auras; e para ti jaspeie a bonança mares de leite!
Enquanto vogas assim à discrição do vento, airoso barco, volva às brancas areias a saudade, que te acompanha, mas não se parte da terra onde revoa." (Iracema, José de Alencar*).



Esse apanhadinho de trechos do livro Iracema, de José de Alencar, ilustra na verdade, a imagem final desta "prosa-poética", (a linguagem salta aos olhos), quando Martim, um guerreiro europeu, despede-se de sua amada, a índia Iracema, já morta, e das terras cearences. Ele está em seu navio, a caminho da Europa, juntamente com o seu filho, "filho da mesma terra selvagem", como diria o autor. Mas eu resolvi colocar esse trecho aqui, pela quase saudação que é feita aos navegantes e ao "Vento". É um deleite linguístico do sentir-se "junto" ao Vento...

O vento... e Maria.






O Vento, soava ruidoso, e Maria ouvia, e sentia a pele fria. Gostava. Ela estendia os braços, e queria sentir mais. Tirou o casaco. Os cabelos voavam, os sons do vento e o frio no corpo de Maria... Não, ela não tinha como dizer... N ã o. E o vento soava assim, soprava, assubiava aos ouvidos, ela sentia-se arrepiada. sss... S i m. O Vento sabia bem como fazer Maria dizer sim. Ele era tão convidativo, e ela menina: "Eu vôo".

- Alô? Aqui é a Iracema da América.


"Iracema voou
Para a América
Leva roupa de lã
E anda lépida
Vê um filme de quando em vez
Não domina o idioma inglês
Lava chão numa casa de chá
Tem saído ao luar
Com um mímico
Ambiciona estudar
Canto lírico
Não dá mole pra polícia
Se puder, vai ficando por lá
Tem saudade do Ceará
Mas não muita
Uns dias, afoita
Me liga a cobrar
- É Iracema da América..."
(Iracema Voou, Chico Buarque*)



Era só Iracema, agora é Iracema das Américas. E não foram as rodinhas e nem as asas... Sim, pois Iracema também era anjo. Anjo rechonchudo, de saia de crochê e cachos. Na verdade Iracema também era Ana, Alice, Pagu, Carolina, Sofia, Amélia e Melany. Isso tudo porque Iracema era Maria, e Maria, transformava-se em outras... Vinha o Vento, vinham os caminhos... e puft! Ia-se uma, vinha a outra. Natureza. Luas e essa desculpa eterna... Talvez porque fosse atriz, talvez porque pensava-se gata e se jogava!!! Logo viriam mais seis vidas... Ou talvez porque, Maria, acima de tudo, amava muito. Era a alma... E se Iracema fosse um camaleão? O fato era que se sabia, Maria transforma-se em outras.

menina dos olhos



- Eu queria saber... se isso dos seus olhos, seus olhos tem alguma coisa que não sei como explicar... Eu queria saber se quando você me olha, esse é um jeito que você olha só pra mim, ou se é o seu jeito de olhar para o mundo, seu jeito de enxergar o mundo... Tá entendendo o que eu quero dizer?




Ela olha mais.