terça-feira, 9 de outubro de 2007

Ode à bike



I.Era ut retro

Era uma quarta-feira, e eram sete horas da noite. Ela estava sentada a algumas horas diante do computador. Dia de folga. E o prazer de rever umas fotografias, escrever uns e-mails, fazer uma leitura, prazer de tempo livre. O telefone tocou.

- Oi tudo bem! Lembra de mim? Sou eu, o Vladi.

- Olá, tudo bem.

- Eu resolvi te ligar porque pensei que talvez poderia te convidar para sair, o que você acha? Você tem tempo livre no final de semana? Nós poderíamos sair para jantar em algum lugar, qual é o...

- O que vc tá fazendo agora?

- Ah, eu estou chegando em casa. Mas porque, você... Você está com fome? Gostaria de sair para comermos alguma coisa?

- Na verdade, eu não tô com fome não. Acabei de comer. Você gosta de natureza?

- Se eu gosto do que?

- De natureza, tô perguntando se você gosta de natureza?

- Ah, sim, eu gosto, mas porque...

- Não, porque eu tô com uma saudade de natureza, e eu conheço um lugar meio escondido maravilhoso, dá pra ver a lua, tem um jardim, de frente para o rio, lindo. Você tem uma bicicleta?

- Se, se eu tenho uma bicicleta... Não, por que? Você tem uma bicicleta??? Você anda de bicicleta na cidade?... Mas por que você está me perguntando isso? Você tem uma bicicleta pra me emprestar?

- Não tenho uma bicicleta pra te emprestar. É que da última vez que fui lá, cheguei de bicicleta...

- Mas dá para chegar sem ser de bicicleta?

- Olha, eu nunca fui a pé, mas agente acha. Não se preocupa. Vamos nos encontrar no metrô daqui uma hora?


***
II.Eius est nolle qui potest velle

Eram duas horas depois, e Alice caminha até o lugar combinado. Ele estava vestido de preto, braços cruzados, boné. E Alice, vermelho, cabelos soltos, sorriso largo no rosto. Ele, silêncio, sobrancelhas espremidas no centro da testa. Ela, entre risadas e muitos assuntos. Dizia, divertida:

- Nossa, uma das melhores coisas aqui é andar de bicicleta, eu faço tudo de bicicleta, vou para qualquer lugar, em qualquer horário. É que na verdade, eu gosto de adrenalina...

- Ah é?

- É, eu gosto de praticar esportes radicais. Já fiz rapel, bungee jump, trilhas... Ah! Teve uma vez que...

- E... você costuma fazer essas coisas sempre? - Perguntava encolhido no banco do metrô, olhos arregalados em direção a Alice.

- Claro, adoro uma emoção.

- Mas me fala, esse lugar que você está me levando, é seguro? Tem mais gente por lá? Onde que fica mesmo?

- Não se preocupa não! Você vai adorar. Quer um chiclete?


***
III.Era ut supra

Eram horas depois. Eram caminhadas depois. Eram as estrelas, era a lua e eram os aviões que passavam. Era a escuridão da noite, eram as árvores, eram as cores das flores. Eram as luzes da cidade refletidas no rio, e era o cheiro do rio. Era a melodia dos grilos e o forte som da água batendo na madeira. Era o vento fresco e manso que sentiam na pele, era o clima agradável. Eram as luzes azuis que decoravam o jardim, era a arquitetura grega em volta do campo. Era Eros ébrio e Hera sem argos ares. Era de aquário.

- Nunca tinha vindo para esse lugar. Que perfeito. É isso, essa é a palavra, perfeito... Sabe, quando você me convidou, pensei assim, "Como assim!!! ela está me perguntando se eu tenho uma bicicleta". Mas resolvi vir por que pensei que poderia ser alguma coisa interessante. Diferente, com certeza. Mas esse lugar é especial, como descobriu? Eu nunca tinha vindo aqui, e olha que eu moro aqui a mais tempo que você... Nem parece que estamos tão perto da cidade.

Alice olhou. Alice apenas disse:

- Foi com a minha bicicleta.


***
OBS. Tradução das expressões em latim:
Eius est nolle qui potest velle: Pode não querer, quem pode querer.
Era ut retro: Data como atrás.
Era ut supra: Data como acima, data supra.

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