sábado, 22 de setembro de 2007

Esquadros da Adriana

"Eu ando pelo mundo prestando atenção,
em cores que não sei o nome.
Cores de Almodovar, cores de Frida Kahlo, cores.
Passeio pelo escuro,
Eu presto muita atenção no que meu irmão ouve.
E com o uma segunda pele, um calo, uma casca,
Uma cápsula protetora,
Eu quero chegar antes.
Pra sinalizar o estar de cada coisa, filtrar seus graus.
Eu ando pelo mundo divertindo gente.
Chorando ao telefone e vendo doer
A fome dos meninos que têm fome.
Pela janela do quarto,
Pela janela do carro,
Pela tela,
Pela janela,
Quem é ela , quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado, remoto controle.
Eu ando pelo mundo, e os automóveis correm para quê?
As crianças correm para onde?
Trânsito entre dois lados,
De um lado eu gosto de opostos, expondo o meu modo, me mostro.
Eu canto para quem?
Eu ando pelo mundo e meus amigos, cadê?
Minha alegria, meu cansaço?
Meu amor cadê você?
Eu acordei, não tem ninguém ao lado.
Eu ando pelo mundo e meus amigos, cadê?
Minha alegria, meu cansaço?
Meu amor cadê você?
Eu acordei, não tem ninguém ao lado." A. Calcanhoto


As linhas perpendiculares são riscadas na folha branca de papel. O lápis desliza sobre a folha fazendo um som que soa mais como o motor de um trem em movimento. Colisão. Dois trêns, duas linhas, noventa graus, estações e degraus. Ângulo reto, e as linhas trilhadas, em silêncio. Plenitude da Esquadria. Culpa da Adriana.

Quem é ela? Quem é ele? Longíquo controle de enquadrar, ou controle remoto moderno de clicar. Amor Tecnológico. Amor ao quadrado. Esquadros.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

história de uma gata... Miauuu!



No Camarim, Alice estava nervosa. Adorava aquela artista. Queria pular, agarrar... Mas conteve-se. Olhou, postura no lugar, pernas cruzadas. Sim, Alice parecia elegante.

- Eu gostro de entrar nas minhas comunidades do orkut, pra ver o que as pessoas estão falando de mim, e... (dizia Vanessa) Teve uma vez, uma menina falando que o namorado havia mandado para ela a minha música nova, a *Boa Sorte*, e ela tava perguntando para as pessoas se eles concordavam que o tal namorado gostaria de terminar com ela ou não... Eu pensei, minha filha!!! (e gesticula uma cara de louca). É muita inocência!!! rsrs...

- (Vanessa da Mata continuou) Mas é muito louco essa coisa de como a música pode marcar um momento da sua vida.... Chega até a ser uma coisa meio sensorial, de você conseguir sentir o cheiro, de sentir aquela mesma energia de novo... Essa coisa da lembrança, da força que uma música pode trazer pra você. Todo mundo tem uma música que marca uma determinada fase. Teve uma fã minha, que me disse que estava pensando em fazer um aborto, e escutou aquela minha música do primeir cd, sobre a chegada do filho (cantarola um pouquinho). Ela veio me agradecer depois de um show, dizendo que aquela música foi para ela, que ela não abortou o filho por causa da música... E é muito louco por que a música não falava exatamente disso.

Nesse momento Alice teve vontade de interromper! Queria dizer que uma música interpretada pela própria Vanessa que também fez história na sua vida, que mudou o seu rumo, e que lhe deu força. Talvez fosse a música do começar conhecer-se Maria, de conhecer-se Vento. Não, Maria viu-se tímida diante de Vanessa, e diante de vocês também... Mas, a questão é que dessa vez, ela conta qual a música:

*Historia de uma Gata*
Chico Buarque

Me alimentaram
Me acariciaram
Me aliciaram
Me acostumaram

O meu mundo era o apartamento
Detefon, almofada e trato
Todo dia filé-mignon
Ou mesmo um bom filé... de gato
Me diziam todo momento
Fique em casa, não tome vento
Mas é duro ficar na sua
Quando à luz da lua
Tantos gatos pela rua
Toda a noite vão cantando assim

Nós, gatos, já nascemos pobres
Porém, já nascemos livres
Senhor, senhora, senhorio
Felino, não reconhecerás

De manhã eu voltei pra casa
Fui barrada na portaria
Sem filé e sem almofada
Por causa da cantoria
Mas agora o meu dia-a-dia
É no meio da gataria
Pela rua virando lata
Eu sou mais eu, mais gata
Numa louca serenata
Que de noite sai cantando assim

Nós, gatos, já nascemos pobres
Porém, já nascemos livres
Senhor, senhora, senhorio
Felino, não reconhecerás

*Good Look, Boa Sorte*



Ela chegou em casa cansada, e olhou no relógio. Iria ou não iria para aquele show... Faltava uma hora para o inicio do show, e ela estava na cama, deitada, olhando indecisa para o relogio. Pegou a carteira. Tinha cento e quarenta reais, e o show custava cento e vinte. Sim, poderia ficar um tempo sem dinheiro, estava tão em cima da hora, e ela estava tão cansada, afinal ela passou o dia todo carregando aquelas caixas... Pensou que poderia aproveitar aqueles minutos pra descansar, tanto tempo que não dormia... Foi para show! Sim, se arrumou em um minuto em foi para o show. Definitivamente toda aquela quantidade de fatores pesando contra sugeriu na garota uma desejo grávido de ir para o show. Levantou correndo, abriu a gaveta, procurou a roupa mais colorida, colocou tiara, brinco, anel, pulseira, meia colante, sapato vermelho, saia, e por que não uma blusinha preta de bolinhas? Pronto. Estava perfeita! Maquina digital, pilhas... Foi sem banho. Tudo em exatos dois minutos... Pronta, aprontava-se e aprontava. Já no metrô, houve tempo para respirar, respirou. Ahhhh!

Chegou no show, escolheu uma entre as possíveis cem pessoas presentes na frente do teatro, para perguntar onde seria a tal da bilheteria. A pessoa que escolheu para perguntar sobre a tal da bilheteria, por acaso tinha um ingresso a mais, de uma amigo que não havia aparecido, para a área VIP do show. Foi, sentou na terceira fileira, dançou saborosa, e ainda entrou no camarim do pseudo-artista. E pensava deliciada... eu amo a minha liberdade. Sabia que dificilmente essas coisas acontecem quando se está acompanhada de muita gente. Fazer o que, ela bem sabia da paz de se viver solto. Depois do show, e com a mesma companhia, conheceu o artista, a empresária, os músicos... E depois, algumas novas ruas, alguma nova praça... Estava cheia de vida... Estava feliz. Mas os pés, sorrateiros, sempre com as suas rodinhas. E disse elegante: não.

Viva o keep going à La Bete...

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

junto ao Vento...




"Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaúba.
Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros;
Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa, para que o barco aventureiro manso resvale à flor das águas.
Onde vai a afouta jangada, que deixa rápida a costa cearense, aberta ao fresco terral a grande vela?
Onde vai como branca alcíone buscando o rochedo pátrio nas solidões do oceano?
(...)
A lufada intermitente traz da praia um eco vibrante, que ressoa entre o marulho das vagas:
- Iracema !
Que deixara ele na terra do exílio?
(...)
Refresca o VENTO.
O rulo das vagas precipita. O barco salta sobre as ondas e desaparece no horizonte. Abre-se a imensidade dos mares, e a borrasca enverga, como o condor, as foscas asas sobre o abismo.
Deus te leve a salvo, brioso e altivo barco, por entre as vagas revoltas, e te poje nalguma enseada amiga. Soprem para ti as brandas auras; e para ti jaspeie a bonança mares de leite!
Enquanto vogas assim à discrição do vento, airoso barco, volva às brancas areias a saudade, que te acompanha, mas não se parte da terra onde revoa." (Iracema, José de Alencar*).



Esse apanhadinho de trechos do livro Iracema, de José de Alencar, ilustra na verdade, a imagem final desta "prosa-poética", (a linguagem salta aos olhos), quando Martim, um guerreiro europeu, despede-se de sua amada, a índia Iracema, já morta, e das terras cearences. Ele está em seu navio, a caminho da Europa, juntamente com o seu filho, "filho da mesma terra selvagem", como diria o autor. Mas eu resolvi colocar esse trecho aqui, pela quase saudação que é feita aos navegantes e ao "Vento". É um deleite linguístico do sentir-se "junto" ao Vento...

O vento... e Maria.






O Vento, soava ruidoso, e Maria ouvia, e sentia a pele fria. Gostava. Ela estendia os braços, e queria sentir mais. Tirou o casaco. Os cabelos voavam, os sons do vento e o frio no corpo de Maria... Não, ela não tinha como dizer... N ã o. E o vento soava assim, soprava, assubiava aos ouvidos, ela sentia-se arrepiada. sss... S i m. O Vento sabia bem como fazer Maria dizer sim. Ele era tão convidativo, e ela menina: "Eu vôo".

- Alô? Aqui é a Iracema da América.


"Iracema voou
Para a América
Leva roupa de lã
E anda lépida
Vê um filme de quando em vez
Não domina o idioma inglês
Lava chão numa casa de chá
Tem saído ao luar
Com um mímico
Ambiciona estudar
Canto lírico
Não dá mole pra polícia
Se puder, vai ficando por lá
Tem saudade do Ceará
Mas não muita
Uns dias, afoita
Me liga a cobrar
- É Iracema da América..."
(Iracema Voou, Chico Buarque*)



Era só Iracema, agora é Iracema das Américas. E não foram as rodinhas e nem as asas... Sim, pois Iracema também era anjo. Anjo rechonchudo, de saia de crochê e cachos. Na verdade Iracema também era Ana, Alice, Pagu, Carolina, Sofia, Amélia e Melany. Isso tudo porque Iracema era Maria, e Maria, transformava-se em outras... Vinha o Vento, vinham os caminhos... e puft! Ia-se uma, vinha a outra. Natureza. Luas e essa desculpa eterna... Talvez porque fosse atriz, talvez porque pensava-se gata e se jogava!!! Logo viriam mais seis vidas... Ou talvez porque, Maria, acima de tudo, amava muito. Era a alma... E se Iracema fosse um camaleão? O fato era que se sabia, Maria transforma-se em outras.

menina dos olhos



- Eu queria saber... se isso dos seus olhos, seus olhos tem alguma coisa que não sei como explicar... Eu queria saber se quando você me olha, esse é um jeito que você olha só pra mim, ou se é o seu jeito de olhar para o mundo, seu jeito de enxergar o mundo... Tá entendendo o que eu quero dizer?




Ela olha mais.