sábado, 23 de fevereiro de 2008

Emmanuel e Maria, com chico.





"Desvendando, paulatinamente, as sublimes grandiosidades da natureza invisível, Maria embriagou-se com as belezas de tão lindos mistérios e estabeleceu o caminho para encontrar-se.

Descobrira o mundo microbiano, ao preço de acuradas perquirições.

É que os limites vigentes eram defeituosos e deformados pelos seus atributos exclusivamente humanos. Estavam acorrentados ao dogmatismo e escravizados aos interesses do mundo.

A confusão estabeleceu-se.

Foi quando Maria fez sentir mais claramente a grandeza de Seu ensinamento.

O céu descerrou um fragmento de seu mistério e a voz dos espaços se fez ouvir...

Esclarecida, inumerável e magnética."

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

homem = máquina de escrever









Eu quero fazer uma indicação descarada de leitura. Uma viagem que clareia. Feito fernanda que faz a diferença.

http://www.maquinadeescrever.com/

Entre visitas blogueiras na madrugada cliquei em Fernando Paiva, um jornalista compulsivo. Mas na verdade, mais máquina de escrever do que jornalista. E mais compulsivo do que as outras duas coisas. Muito bom!

O mágico da Taberna Minhota é subversivo, mas não é literal.


O que é literal? A relidade é subversiva por que fala por sí só e sem palvras, principalmente se falarmos de uma cidade grande, e mais ainda, de São Paulo. Das multidões aglomeradas, da violência, do trânsito, do PCC, das crianças descalças no farol. O que é subversivo? Passeata? Greve geral? Uma guerra? Uma flor? O banho das crianças de rua nas fontes de água da praça da Sé? Banho com sabonete! Banho com risadas enquanto olham os advogados que passam e fingem que não os vêem? A terceira idade da colônia japonesa (a maior concentração de japoneses fora do país de origem encontram-se na nossa capital) em plena era do sedentarismo praticando exercícios físicos na praça da Liberdade às sete horas da manhã com música!!! E eles dançam animados! 25 de março? Trocar telefone no trânsito parado? Namorar a tarde no vão do Masp?

Quando recebi esse e-mail de uma amiga, e li, com os textos de no máximo cem palavras desenvolvidos por escritores e blogueiros sobre a cidade de São Paulo, não me espantei, ao contrário da Revista quando ela afirma, com surpresa, que nenhum dos 20 contos recebidos tinham um final feliz.


Os contos, inclusive encabeçados por um ator que admiro, Marcelino Freire, são exatamente o que eu conheço de rodas culturais literárias na noite paulistana.


A tinta da caneta é cinza, as roupas são pretas, o discurso é splum, e o café é sem açucar. As carreiras são as das cocas-colas. E as reclamações são as mesmas, e a imagem pinta pouco. É prostituta bêbada e suja, os cigarros, os incompreendidos da noite, a madame alienada, o cachorro da madame que usa shampoos caros, a classe média sentindo cinza a dor que sangra vermelho em uma maioria que não escreve. É uma separação, deles versus nós, que na verdade, se sem preconceito, poderia juntar. Poderia olhar sem provincianismos de suas rodinhas e ver mais longe. Ver junto. Todos são os patos, e os patos fazem quá quá.


A classe média que não vai até a favela, mas fala de sentimento de compaixão embriagada de verborragia e drogas que são compradas e sustetam a violência nas favelas. (Olha a tropa de elite!). E depois, os intelectuais que gozam de suas habilidades de sedução dicursivas nas belas ouvintes de esquerda com seus decotes, que não são nem canhotas, mas são vazias também. E ficam falando do que seria proibido, levantando bandeiras e achando que chocam por falar de sexo sujo em suas métricas, por falar de drogas, suicídio, homosexualismo, ateísmo ou poligamia natural. Não me convencem. Conheci Catulo.


Denuciar diferença social choca naturalmente, por ser tão humano, e por ser sentimento. Já folhearam o livro África, de Sebastião Salgado? Ninguém de preto, e tudo de verdade mesmo.

Talvez, como paulista, deseje uns cariocas para tirar uma onda, mesmo quando é tando na maior puruca. Ou um gaucho para dançar a chula em cabo de vassoura. Pergunte ao sertanejo, ou ao seringueiro. Os paulisas perdidos dentro da sua cidade, tão cosmopolita podiam contar talvez da tarde de amor da Josisvânia e do Jair no Ibirapuera, poderia contar que ocupação na reitoria da Usp virou invasão de reitoria da novela da globo (que triste!)rs. Poderia contar como o carteiro chega nas casas que não tem número e nas ruas que não existem. Eles chegam de verdade.

Bom, para esclarecer, falava desta matéria abaixo. Desabafava. Sim, é da Folha e eu não concordo com tudo o que a Mariane escreve. Mas achei interessante o fato de um número relevante de jovens escritores paulistas compartilharem de uma mesma onda. Slum, splash neles! Ficou quase um Grease, mas sem a brilhantina.


***


Folha de São Paulo. Suplemento: Revista da Folha. p. 20-27. São Paulo, 13/01/08.

Conte até cem
Jovens escritores imprimem descrença e pessimismo em microcontos que têm a cidade como pano de fundo


por Marianne Piemonte

Essa conversa de que quem conta um conto aumenta um ponto foi aqui subvertida. Escritores estreantes (alguns nem tanto) e blogueiros receberam a missão de contar histórias com o limite de cem palavras. Nem ponto nem vírgula a mais ou a menos. São Paulo deveria aparecer como tema, cenário ou coadjuvante nos textos. Para a surpresa da Revista, dos 20 microcontos que chegaram à redação, 3 falavam de suicídio e, nos demais, havia sopros de melancolia e toda a sorte de mazelas existenciais. Estará a nova geração desacreditada da vida? Ou São Paulo para esses jovens exala pessimismo e descrença? Para a professora de filosofia da PUC-SP, Sônia Campaner, 50, não se pode dizer que há uma reedição do Romantismo, mas, como naquele momento (quando a geração mal-do-século morria tuberculosa, entre os séculos 18 e 19), talvez o mesmo sentimento de ausência esteja de volta. "A cidade é uma espécie de signo de uma cultura que oprime, e a arte é um termômetro desse sentimento", diz. Mas, ao contrário dos byronianos (seguidores de Lord Byron, expoente daquela escola literária), os paulistanos desiludidos extraem do concreto e da violência sua matéria-prima, produzindo uma literatura demasiadamente realista e de tons acinzentados. Na opinião da professora de crítica literária da PUC-SP, Vera Bastazin, 50, o diálogo entre a arte e o cotidiano é algo inevitável. "Mas o que impressiona e assusta é que esses autores parecem estar com o imaginário aprisionado no dia-a-dia. Não há libertação nem na imaginação. Com esse binômio fundido, a realidade não é usada como motivação, mas como fator determinante, o que é muito sério em termos de arte", acha. Questionados sobre seu trabalho ser pessimista, os escritores discordam. "Não me parece que o meu conto seja 'deprê'. De qualquer modo, penso que toda a literatura não fala de outra coisa senão de morte e, talvez, amor (no fundo, uma variação do primeiro tema). São Paulo não tem nenhuma culpa por isso", diz Verônica Stigger, 35, que participa com o conto "200 m2". Os novatos Vanessa Barbara, 25, e Emilio Fraia, 25, preferem entrar na discussão de outra forma, embutindo crítica social numa estética nonsense. Ela: "Eu e o Emilio fazemos parte de uma corrente literária que aborda apenas os grandes temas: patos e palhaços. O último palhaço feliz que eu vi em São Paulo estava aos prantos. O último pato, dentro de uma panqueca... Não é uma cidade particularmente amistosa para quem não tem CPF". Ele: "Tem um poema do García Lorca que diz que 'todos os dias são mortos em Nova York quatro milhões de patos'. 'Debajo de las multiplicaciones/ hay una gota de sangre de pato'. Em São Paulo é assim também. Nada de CPF". (Entenda por "pato" a criatura excluída que quiser.) A escritora, doutora em literatura e colaboradora da Folha Noemi Jaffe, 45, diverte-se com a discussão. "Parece que há uma tendência na literatura contemporânea a uma pseudo-imitação de Rubem Fonseca, mas de forma fácil", diz. Para ela, os jovens autores demonstram um apego ao maldito, uma vontade de chocar e de se mostrar marginal que beira a adolescência. "A vida está tão dura que fica a idéia de que é preciso ser literal para ser político. Mas, assim, eles se esquecem do lado poético da poesia." Noemi lembra um conto de Julio Cortázar, no qual um homem cospe coelhos. "Aquilo era subversivo e não foi preciso ser literal para ser político", diz. Para os convidados neste exercício, a lírica é outra. São Paulo até cabe em cem palavras, mas nenhuma delas comporta final feliz.

o dia em que as meninas atravessaram aquela porta... As que foram e as que ficaram. São a mesma.


"Não reescreverei o livro. Mitiguei seus excessos barrocos, limei asperezas, risquei sentimentalismos e imprecisões e, no decurso desse labor às vezes grato e outras vezes incômodo, senti que aquele rapaz que em 1923 o escreveu já era essencialmente - que significa essencialmente? - o senhor que agora se resigna ou corrige. Somos o mesmo; os dois descremos do fracasso e do sucesso, das escolas literárias e de seus dogmas. (...). Naquele tempo procurava os entardeceres, os arrabaldes e a desdita; agora, as manhãs, o centro e a serenidade".

Jorge Luis Borges, no Prólogo datado em agosto de 1969, para o livro "Fervor de Buenos Aires", que foi escrito em 1923, pelo mesmo autor. São o mesmo.


***
Um vulto preto descia a escada correndo como se fosse cair. Chave. Um vulto preto e desastrado. No segundo andar, uma menina, cabelos longos, sentada à penteadeira, no canto esquerdo do quarto. Penteava o cabelo. No banheiro do primeiro piso, outra. Ela estava nua. Ela fazia poses ardentes para o espelho e dalí não sairia. Apaixonada, vadia. Chave. Um vulto claro era como se luz entrando janela a dentro em direção ao altar cultuado na sala. Na cozinha, de avental, outra menina cozinhava. Havia uma menina com a tesoura na mão na sala, cortava os cabelos com força e violência. No porão, sete meninas gordinhas riam e brincavam de boneca, de amarelinha e de cambalhota. Estas eram sete. Sete. Chave.No escritório, três mulheres que liam e falavam sozinhas e andavam, como se calmas e desperadas, de um lado para outro. Agora, eram cinco delas. Uma senhora de chapéu violeta também passeava pela casa, calada, sábia. Ela olhavas as meninas, os vultos, as mulheres, as crianças. Reparava nas cores da parede, cinza, pretas, vermelhas, verde. Reparava no móveis da casa. Na sujeira, na limpesa. Gostava da música. Chave. Ela olhava olhando por todas. E caminhava. Chave. Ela notou a chave. Pensou em tocá-la. Será? Uma menina que tinha mania de andar com a cabeça virada pra cima tropeçou. A chave. Senhora de sí. Chave. Porta. E as meninas gordinhas que se riam:
- Vamos brincar de mãe da rua?
O dia em que a menina atravessou aquela porta, ela, elas, não seriam mais as mesmas, se a, as mesmas pudessem ser se houvessem ficado. Não seriam e existem. São sãs. Menina, Senhora e Maria. Existem todas e são loucas.

domingo, 10 de fevereiro de 2008

as vilas dos renatos





"Coloridas de um jeito que não existe. Digo, Não existe". Maria disse isso enquanto pensava no Movimento Surrealista e na falta que Salvador Dalí fazia aos tempos modernos e realistas. Digo, de verdade. Que a imaginação e a critividade não são alienação, mas criação, escolha. O movimento que recusa a lógica, a razão, e o enquandramento quotidiano, do real cotidiano. O pseudo-real dos jornais e dos falares. O surrealismo rasga o jornal em pedacinhos e dele, um mural apoteótico, sem sentido consciente. Falamos de um movimento arisco a "mania incurável de reduzir o desconhecido ao conhecido, ao classificável, que só serve para entorpecer cérebros”, e de uma proposta de mergulho ao mundo do fantástico, na liberdade proposta tecnicamente pelo psiquismo imediato e que induz o ser ao estado de estase. Propõe o abstrato.

"Este movimento artístico surge todas às vezes que a imaginação se manifesta livremente, sem o freio do espírito crítico, o que vale é o impulso psíquico. Os surrealistas deixam o mundo real para penetrarem no irreal, pois a emoção mais profunda do ser tem todas as possibilidades de se expressar apenas com a aproximação do fantástico, no ponto onde a razão humana perde o controle".